CIRROSE MUSICAL

OUTUBRO | 2013
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Cirrose Musical
Não queria perder o meu tempo com essa moça — ela simplesmente não vale a pena. Se o faço, é por uma razão e uma razão apenas: para tomar partido em uma discussão e sair em defesa de uma verdadeira artista, Sinéad O’Connor, 46, cantora e compositora irlandesa.
Quem acompanha com alguma regularidade as notícias da indústria fonográfica — não vou falar em notícias do show business, pois essas são meias-irmãs das notícias de celebridades, as quais não acompanho — sabe de que moça fala-se aqui: Miley Cyrus, 20, americana e … Bem, a moça pensa que é atriz e pensa que é cantora.
Há algumas poucas semanas, Cyrus lançou o vídeo de seu mais novo trabalho, Wrecking Ball, e declarou que a concepção é inspirada no vídeo de Nothing Compares to U, lançado por O’Connor em 1990. Com a declaração, a irlandesa — que nunca foi de deixar de dizer o que pensa — foi procurada por vários veículos da imprensa para que expressasse a sua opinião sobre o assunto. E, em lugar de conversar com os vários jornalistas individualmente, decidiu escrever uma carta aberta à americana, aconselhando-a a não se deixar explorar pela indústria. “Fico extremamente preocupada com a possibilidade de que as pessoas à sua volta a tenham encorajado a acreditar que é aceitável aparecer sem roupas e lambendo marretas em seu vídeo”, escreve O’Connor.
A carta de O’Connor é atenciosa, cortês, polida, maternal. A resposta de Miley Cyrus veio em forma de tuítes imbuídos com a vulgaridade que lhe é peculiar, e disparados de forma ofensiva e pessoal. Essa troca continuou nos dias que se seguiram, e geraram mais quatro cartas abertas escritas por Sinead. As cartas, aliás, estão todas no site da artista. Uma simples comparação entre esse endereço — elegante e profissional — e o site da moça mostra a distância entre as duas. E coloca distância nisso.
O vídeo de Nothing Compares to U é uma obra-prima do gênero. Já o de Wrecking Ball é uma peça pornográfica, sonorizada por uma música vazia. Sexualidade é uma parte inerente e profunda da vida. Não há absolutamente qualquer coisa errada com o sexo ou a sensualidade em si. Mas quando um artista atinge o público infanto-juvenil, altamente sugestionável, com vídeos pornôs ou performances ao vivo altamente eróticas, a coisa muda de figura. Passa-se a tratar da proteção de crianças. É adequado que uma garota de sete anos copie o seu ídolo da televisão e saia pela sala balançando a pélvis como uma pole-dancer? Não deveria haver limites? Ainda que se acredite e que se defenda a liberdade de expressão, o quanto da atual avalanche de performances erotizadas realmente se trata de expressão artística, e o quanto se deve meramente à ânsia mercadológica em vender discos? Nesse jogo, talvez Cyrus seja apenas uma peça da indústria — mas certamente, ciente ou não, leva a baixaria a um novo nível.
Tristemente, o simples fato de se comentar aqui — e em tantos outros lugares — sobre a performance de Miley certamente criará mais curiosidade sobre o seu vídeo, e venderá mais cópias de seus discos. Melhor, todavia, voltar vinte e três anos no tempo e assistir a Sineád, no lindo Nothing Compares to U. Aquilo é arte. Algo que Cyrus desconhece.
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